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sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Melancolia moderna

E foi assim, apenas nesse fulgor momentâneo que encontrei em mim a falta de ti.

E foi assim, apenas nesse instante pequeno que percebi o mundo em mim.

Sabe quando a gente aprende o be-a-bâ e muita coisa se perde no antes?

Perdeu-se então, como sempre se perde, 
como talvez nunca se encontre.

Ah, vide a vida que lhe apresento, 
aquela que talvez nunca veja,
talvez nunca perceba.

Mas aí está a beleza de uma falta, de um suprir.

Tudo é muito, tudo trasnborda e o que era muito se torna ainda menor.

É que faltar talvez não seja o pior,
talvez exceder seja a máscara do completo.

Flora S.


quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Ato primeiro

    A ola iniciou seu curso enquanto pessoas e ares entravam pela porta. Janelas abertas, cadeiras preenchidas e olhares ansiosos. Papéis por serem feitos, textos por serem ditos. Roupas pretas espalhadas pelo chão esperando pelo fim de um discurso indeterminado, discurso inesperado, discurso impensável. Eles prestam atenção em tudo, disse o diretor. Eles prestavam atenção em seus olhos e não perdiam seus pontos fixos. Começou.
    Mulheres, mulheres, mulheres. Homens esparsos entre momentos femininos e dores pungentes. Uma dor de ansiedade, uma merda por ser dita, um olhar por ser trocado. O tempo já era e o agora se fazia presente. A onde levou o mar. Chico jogou sua gota d’água e saldou o início. Era ali, era o fim da onda constante.
    Fernanda despejou seu ódio. Homens, seres tão insignificantes se encolheram ao ouvir o toque. Mas logo veio García Lorca e sua Yerma com dor. A mulher sem criança sofreu a esperança de ter o filho. E Sartre manteve a quarta parede, incluiu dor e sofrimento. Mulher, espere-o com lágrimas nos olhos, o arrependimento nunca virá, o homem não se curvará. Enforque-o, entregue-o, arraste-o.
    Nelson montou o retrato. Todo mundo é doido, todo mundo é tolo. Geni saiu do quadro, sangue escorreu de dentes, veneno se alastrou no largo. Olegário, morto. Seus sapatos? Ninguém sabe de nada. Mulher que deseja a morte do marido. Filho que pediu um amor de mãe, pediu o útero, Largou a barriga. Um beijo oco no asfalto que ficou na lembrança dos que nada viram. Foi aí que chegou a louca, a tresloucada, a família normal.
    Suassuna esbugalhou os olhos, gritou a todos e curvou cabeças. Multidão que segura não era realmente seu sustento, intemperança. Mas o caminho foi construído e Lear teve onde se sentar para sentir sua dor pungente, seu ardor triste. Sua voz clara despertou sentido. Chico renasceu em sua cadeira, Chico retomou o banco, o assento, a privada. E a merda que ele tanto desejou passou para a usura. Para o fleet nos usuráveis, para o povo a ser esmagado. E os noveleiros? Purcina tornou-se estátua, prendeu-se no laço.
Foi aí então que o diabo ganhou asas. Inspire-se em Saramago, largue o Diabo malvado e dê-lhe passos a enrubecê-lo. Diabo, alto e magro que largou suas penas a espera do veneno de Romeu. Amor cegou Julieta. Julieta perdeu sua vida e clamou pelo punhal. Rodou, rodou, rodou. Acabou-se num beijo e permitiu-se entrar. Lorca retomou com sua trilogia e quase como Vader conseguiu trocar a ordem e apresentar então a primeira peça.
    Lançadas ao ar as fagulhas da lua quebraram o gelo e deduraram os amantes. Prenderam homens e rodopiaram mulheres. Desmoronou-se o coração. E foi então que Tenesse Williams teve de entrar e se jogar ao mar, duas vezes. Duas vezes perdido no azul dos olhos de seu grande amor. Duas vezes uma prerrogativa para o insignificante do homem.
    Retomou-se a ola. Fechou-se o círculo. O homem sentado ao lado inseriu-se no grupo, a mulher que centralizou a estrela finalizou sua fala. O discurso sumiu nas duas voltas de ola restante. Esperou-se o aplauso. Encontrou-se o olho do companheiro, o abraço da família, o beijo do amor. O suor desceu-lhe a face e o rubro sangue era mais que palavras, era face, era estado. Esperança do ato seguinte. Aquele ato acabou, restaram atores, amigos, amores. Palavras ditas e reditas, marcas feitas e trocadas, falas decoradas e rememoradas. Amigos. Saudades.

Flora S. (aos saudosos primeiros meses, aos saudosos primeiros companheiros)


domingo, 18 de julho de 2010

Mascarade

Aprendeu a andar. Parou de usar fraldas. Falou pouco durante a infância. Estragou muitas paredes e brinquedos fazendo arte. Nadou durante anos, fez aulas simplesmente porque faz bem, toda criança faz. Abandonou o parquinho, o jardim de infância. Brincou com outras crianças, fez amigos. Foi uma criança normal na mais plena normalidade.
Estudou bastante para as provas difíceis, fora isso procurou fugir dos estudos. Leu pouco, ouviu músicas apenas quando saia ou ia a festas. Frequentou a academia. Fugiu do pensar e das dores. Era assim, tudo simplesmente resolvido. Ficou com algumas pessoas. Namorou quando teve chance. Deu em cima, flertou e transou. Mas para os pais sempre foi normal. Normal.
Usou drogas, bebeu bastante. Frquentou muitos bares e boates. Dirigiu carros rapidamente. Se formou. Fez um curso em busca do diploma, apenas isso. Trabalhou uma vida inteira, um trabalho, não uma carreira. Não formou nenhuma família, priorizou o bem dos pais.
Largou as drogas. Fugiu do álcool. Passou a dirigir lentamente. Parou de fazer arte. Parou de estudar por obrigação, parou de estudar totalmente. Parou de nadar e de brincar. Parou de malhar. Ganhou barriga, ganhou papada, ganhou peso. Ganhou dinheiro. Se bancou. Seus pais morreram. Ficou sozinho ou seria sozinha? Esqueceu de definir quem era.

Flora S.

domingo, 20 de junho de 2010

Entranse


Meu preto
     Teu peito
         Sempre sente

Me ama
     Me come
          Me transa

Receba o recado
      Aceite o pecado
           Argumentos enrolados

Concretude concreta
   Palavras sinceras
       Perdão

Flora S.

domingo, 2 de maio de 2010

Ardeu

Amor é fogo
-Silêncio
Que arde
-Silêncio

E tudo o mais que eu dissesse virava silêncio
Vazio, sem nada
Ele ali e nada
Eu aqui, ardendo
Ele ali e silencia
Eu aqui e fala
Ele ali, perto, longe, longe, distante
Eu aqui, ele lá
Nós dois juntos mas sem junção

Amor é fogo.
-Seu
Que arde sem se ver
-Não vejo
Apagou

Flora S.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Olhar blitz

Estrume, esterco, Pacheco.
Passos largos, sorriso nos lábios desajeitados.
Beijo longo nos lábios marcados.
Aftas que surgem, saem, ardem.
Aftas que passam de alá para o acolá.
Uou's podem trazer dor,
Podem trazer um grupo maior que o menor deles.
Percam-se no estrume da vaca,
No cheiro de chuva que não cheira bem.
A chuva mudou de cor e de estrada.
Seu cheiro se tornou Pacheco.
O estábulo foi longe,
O beijo ficou no lábio murcho,
Na frieza da pele exposta ao nu sem roupa.
A visão deixou de ser nua,
Se despiu do pudor.
As mãos cambalearam sóbrias,
O corpo tremeu insólito.
Sofreu,
O estrume cheirou forte.

Flora S.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Folia desmedida

A cidade ficou embriagada. Pleno carnaval, falta de pessoas, de luz, de carros e de buzinas. Os blocos já se despediram no último raiar de samba. Mas a cidade ficou embriagada. As cervejas jogadas pelo chão, juntas de caixas de papelão e dos rastros de multidão. A ressaca vem logo depois, mas a cidade ficou embriagada. É que a mulher se sentou sobre seus tamancos, mostrou-os que o mundo não é cor de rosa, sujou-os com o negrume dos pés descalços. A mulher estava embriagada, os tamancos estavam desesperados. E eles realmente tentaram fugir, mas como podem simples calçados se recusarem a cobrir pés sujos? A cidade estava embriagada.
É que não havia só uma mulher, havia dois homens correndo pela avenida. Queriam uma emoção, o álcool já não era bastante. Queriam um carro, uma batida, um desvio. Não encontraram nada disso, encontraram a adrenalina do não batido, do quase asfalto. Mas dois homens apenas não se embriagaram sozinhos, tinha ainda gêmeos que se esconderam em rabos de cavalo e chapéus idênticos. Roupas similares e garrafas em mão, só o violão podia destoar um de dois, dois de um. Mas se um era dois ou um era um, que um soubesse quem era, que dois soubesse que não o era. A cidade estava enebriada.
Não prego nada de duplicidade, não havia apenas dois em dois. Havia um bêbado se equilibrando no meio da rua pedindo carona. Queria o ar de qualquer lugar, o assento de qualquer direção. E se ele ficava na ponta dos pés um outro se sentava sonolento. Sonolento, porém simpático, cumprimentando casais, cães e pássaros. Cumprimentando oi's e tchau's descarados, cumprimentando o medo dos cumprimentos obrigados.
E a velocidade do carro que mal existia continuou se escondendo em precauções pós carnaval. As árvores respiravam o álcool das bebidas soltas. O asfalto sentia falta da borracha de carros, entretanto sentia-se asfixiado com tanto lixão. A cidade não tinha mais blocos, não tinha mais beira, mas tinha muita saidera. Tinha tanta gente que repetia saideras. A cidade estava quase de ressaca, o carro não passou dos 60. Observou cada paralelepípedo, escutou cada música de rádio, cada grito desesperado. O carro ficou sem álcool, a cidade ficou de ressaca.

Flora S.


sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

A única


E eu que de tanto amar não consigo parar de nisso falar
E por tanto lhe dar me traduzo em palavras vazias
Que eu não me torne a porcelana na prateleira
Quero o ar e o rock'n'roll
Torno-me o que era, o que sou
E que mil mulheres em uma, seja
Mas seja aquela
A sua aquela

Flora S.